14.7.16

   Poderia começar pelo cheiro a mar que ele trazia e que a fazia sempre sentir-se em casa, de novo. Poderia começar pela camisola cheia de sal ou pelos olhos cheios de amor, mas nada disto importa. Não importa o início, ou a forma como insistimos em contá-lo. Nada disto importa, até porque eles continuam ali, eternamente apaixonados, como dois meninos da escola primária, que deram a mão sem querer e chamavam-se namorados. Separaram-se, como é suposto acontecer em toda a história de amor, onde, por qualquer motivo, as ideias, os sentimentos, o futuro divergiram um pouco do que o que habitualmente os juntava. Separaram-se e quase que, por meros minutos numa paragem de metro, os olhos não se cruzariam, o coração não tentaria saltar do peito, o metro quase se perderia. E é assim que é suposto ser, não é? Uma história de amor? 
   Mas nada disto parece importares-lhes. Continuam ali, abraçados, com os corações esmagados no peito. Ele trouxe-lhe sal e mar e ela deu-lhe flores e sol. Não quero dizer amor, porque estaríamos a ser previsíveis. Previsíveis com a história, com o destino, com a vida. Se um deles desse amor ao outro, uma parte de si, porque é isso que eu acho que o amor é - dar uma parte de nós ao outro - o outro receberia algo em troca maior que si mesmo, ficaria gordo de amor, o que se pode traduzir em egoísta, e nunca daria parte de si, nunca equilibrando o que nós chamaríamos mais grosseiramente por amor. Ou seja, não podemos dar demasiado de nós e não receber nada em troca. A questão não é dar-mos porque sabemos que vamos receber, não. A questão é, depois de dar tantas vezes, sem nunca receber, o amor esgota-se. E como o amor é parte de nós, nós mesmos nos esgotámos. Por isso é que esta história não será mais como começou. Esta história será feita de amor, mascarada de flores, mar, sol e sal. Porque era assim que deveria ter sido desde o início: aos poucos e poucos, ser mais do que era antes e agora ser tão pouco de si. 

Incomplete - James Bay
Algo completamente imprevisível.